terça-feira, 21 de dezembro de 2010

042 > Goiandira - A pesquisa

Osvaldo pesquisa Goiandira e descobre o mundo!...

Goiandira, GO - geral da cidade
Em Goiandira tivemos uma experiência em oposto do Projeto Rondon daquela época. Foi aplicado por nós um questionário sócio-econômico muito interessante, de casa em casa, na cidade (que era bem pequena). Passávamos o dia aplicando o questionário e à noite nos encontrávamos na casa do padre. Bem cansados pelas caminhadas, jantávamos e conversávamos até o sono chegar (e vinha rápido!).
Algumas coisas me chamaram a atenção naquela região: uma delas era que se vivia da cultura do arroz e esse produto era produzido em pequenas propriedades. Essas pequenas propriedades já não tinham condições de enfrentar a concorrência do processo de produção em grande escala da agroindústria do arroz que se formava ao lado. Conclusão: a economia da cidade decaia a cada dia e as pessoas deixavam a cidade à procura de melhores oportunidades.
Goiandira, GO - Hospital Municipal
Outro fato que me chamava a atenção era o número de deficientes mentais (oligofrênicos) que vagavam pelas ruas. Todos sabiam o nome deles e quem eram seus pais. Vagando a esmo pela cidade entravam em qualquer casa a qualquer hora. Brincavam com as crianças da casa como se fizessem parte da família e ali mesmo almoçavam, lanchavam. Depois saiam novamente andando a esmo. Talvez a taxa de oligofrênicos fosse grande porque a região carecesse de cuidados perinatais. Outra hipótese é que os mais inteligentes saiam da cidade... Ora, para onde se conversasse, com quem se falasse havia idéias e sonhos de sair dali. A sensação era de total decadência da região inclusive com a queda, na época, do preço do arroz.
A certa altura encontrei uma grande casa, fui recebido por senhoras idosas e amáveis e logo depois cercado por inúmeras meninas de seus 15 - 16 anos de idade. Todas vestidas de forma sofisticada, maquiadas já pela manhã, me servindo água e café com biscoitos de forma solícita mas com poses sensuais. Eu havia entrado no prostíbulo de Goiandira!!
Quando conversei um pouco mais com essas adolescentes desconfiei do baixo QI delas. As senhoras que comandavam a casa me informaram que elas eram meninas abandonadas e que ali elas tinham uma chance de aprender um ofício e ter casa e comida. Quando uma delas sabia ler, podia frequentar a escola pública da cidade, que elas deixavam. Tratavam-se de senhoras caridosas, sem dúvida!
Matriz Sagrado Coração de Jesus - Goiandira, GO
Todas declararam frequentar a Igreja regularmente e uma delas era até de uma Irmandade. Ninguém ali via problema em comercializar o sexo, já que o preço do arroz estava em baixa. As mocinhas tinham um misto de ingenuidade e malícia, as senhoras pareciam opacas como vidro leitoso.
À época eu era virgem e vivia pensando de forma romântica sobre as relações homem-mulher. Sonhava como uma moça a respeito de minha primeira relação sexual com a mulher amada numa noite de luar com o Cristo Redentor e o Corcovado ao fundo (talvez ouvindo Tom Jobim).
Que mistério profundo abriga cada mulher! Como eu era ingênuo na minha percepção do problema social no Brasil. Goiandira me desvirginou!
Osvaldo
 [Fotos do site da Prefeitura de Goiandira, GO - 2010]

2 comentários:

Bandeira disse...

Camarada Osvaldo:
com a brilhante descrição que fizeste de Goiandira/Goiás, te revelaste um perfeito Sociólogo, escondido atrás da figura do Médico!
Falando em Goiandira/Goiás, me lembrei do Frei Joãozinho, aquele padre norte-americano que media mais de dois metros de altura, e pesava uns 150 kg, doce figura, e que certamente recebeu vocês em Goiandira/Goiás.
Bandeira.

Guina Araújo Ramos disse...

Essas lembranças do Osvaldo são sensacionais!
Eu mal lembro de que a tal pesquisa deu um puta trabalho, dias e dias percorrendo a cidade, entrevistando o povão.
Mas, lembro dos momentos de descanso, da sombra das árvores, da casa ao lado da igreja, onde ficamos.
E do padre Joãozinho, um suave urso avermelhado...